uma coisa que fica martelando na minha cabeça nesse período "dissertativo" da minha vida é a afirmação barthesiana de que a língua é fascista, porque nos obriga a "dizer". eu "digo" coisas mesmo sem ter dito nada e é isso que nos coloca numa posição inferior a alguma coisa (à língua(gem)? ao poder do discurso? a uma força maior? a sei lá o que...), que nem sabemos, de fato, definir. os supostos diálogos sem palavras que acontecem a todo instante poderiam ser imensos livros filosóficos sobre coisas da vida. infinitas teorias já poderiam ter sido registradas se alguém tivesse a capacidade de reverter o silêncio em palavras e organizá-las em textos, em papeis, em arquivos digitais, ou tabuinhas esculpidas. infelizmente eu não sou uma dessas pessoas e olha que meu silêncio é bem barulhento, dentro da minha mente.
a postergação da escritura, tanto aqui, como academicamente falando, só gera mais e mais escritos perdidos em algum lugar no "mundo dos livros não escritos". leio muito e, na verdade, leio pouco. escrevo muito e, na verdade, escrevo pouco. um dia me disseram que quem sabe que não sabe é um sábio. eu poderia ficar satisfeita com essa afirmação, mas eu não sei nem o que é um sábio, há quem diga que é um elogio, eu acho que é uma maldição. não quero ser amaldiçoada, não quero saber tudo, mas a partir do momento que me deram um mínimo "saber" já me deram uma pontinha da maldição do "querer saber mais" e nunca vou saber o suficiente pra ficar satisfeita. isso é frustrante, mas ao mesmo tempo é uma forma de ter sempre um objetivo. às vezes dá vontade de escrever infinitas confissões sobre pensamentos escondidos em algum lugar, que fazem uma pequena aparição momentânea, mas aí eles somem de novo e a coragem e a convicção que estavam com eles desaparecem junto. não sei bem se é questão de coragem, porque não é algo de que eu tenha medo. só acho que é muito difícil decidir o que se acha digno de ser compartilhado, ou registrado. escrever, pensar, cogitar possibilidades quando se está sozinho é quase como tentar sair de um buraco tentando puxar os próprios cabelos. não leva a lugar algum, a gente permanece no mesmo lugar... e com a cabeça doendo. por outro lado é libertador escrever (ou dizer) quando não se tem receio de ser julgado, um dia eu achei que eu não tinha, mas só achei e agora (me) perdi.
a verdade verdadeira é que é (que é que é que é...) tanta coisa pra se ter opinião, são tantos acontecimentos, tantas discussões, que eu canso, desisto antes mesmo de dizer (escrever, argumentar, fazer) qualquer coisa... parece que de nada vai adiantar ter uma opinião que está bastante consistente na nossa cabeça, mas não tem jeito de entrar na cabeça de outra pessoa. pra que se dar ao trabalho então? pra que querer mudar? pra que agir? se eu posso ficar parada, não mostrar o que eu acho, o que eu penso, o que eu sinto... mas aí não vai acontecer nada. e não acontecer nada não é uma coisa muito emocionante ou satisfatória. não vai piorar, mas também não vai melhorar nada. não vai mudar nada. eu não quero o "nada". em contrapartida, i would prefer no to
eu preferiria não ter distúrbios hormonais, eu preferiria não ter que lidar com burocracia, eu preferiria não ter obrigação de escrever, eu preferiria não pensar na minha aparência física, eu preferiria não ter frustrações, eu preferiria não ter responsabilidades, eu preferiria não ter que explicar minhas decisões, eu preferiria não ter que tomar decisões, eu preferiria não depender de ninguém, eu preferiria não achar que existem injustiças no mundo, eu preferiria não me sentir mal ao ver alguém doente, eu preferiria não ter apenas uma visão ocidental do mundo, eu preferiria não estar insatisfeita com política, religião e a sociedade, eu preferiria não estar cheia de dúvidas, eu preferiria não ser egocêntrica, eu preferiria não... ser. (?)
"eu preferiria não", mas eu sei que eu preciso "sim" fazer infinitas coisas, mesmo preferindo não fazer... talvez eu apenas esteja num momento bartlebyano demais e eu não consiga escrever/dizer o que eu gostaria, mas como a língua(gem) é fascista, ela me obriga a dizer, mesmo que seja qualquer coisa que eu nem queira dizer... por isso eu digo. por isso eu escrevo.