quarta-feira, 9 de novembro de 2011

nota explicativa, ou, momentos de "barato"

Não vou me ater muito a tantos detalhes, porque em uma nota explicativa geralmente a pessoa interessada só lê porque sabe do que se trata o assunto principal do texto a que se refere. Por isso, a escolha do título dessa postagem não é a toa (nunca é, mas enfim).

Pra quem acompanha minha novela, já sabe da minha história com o cushing...

Nos últimos dias, várias pessoas que não sabiam da minha "condição" acabaram sabendo das minhas aventuras de saúde por meio de uma forma um pouco sensacionalista, pelas redes sociais. Meus pais davam boletins médicos a todo instante e em meio a zilhões de mensagens de "melhoras, Rafa" mais zilhões de perguntas "o que aconteceu!?" surgiram.  
Resolvi tornar um pouco mais claro e também contar minhas peripécias, porque eu adoro uma fofoca. 
Há quem acredite que ficar dando detalhes da vida pessoal na internet pra todo mundo ver não é legal e etc, eu também acredito, mas ah... como eu fiz uma cirurgia no cérebro vamos jogar a culpa nisso, digamos que fiquei meio louca momentaneamente e vou sair falando (quase) tudo. 

Ok, chega de enrolação e vamos para as partes "sórdidas"... 

Acabou a graduação, começaram as aulas do mestrado, aquela coisa toda,  a discussão sobre o cushing tava meio de lado, mas a dosagem do remédio sempre aumentando e nada de o cortisol baixar... Fui em novas consultas, mais discussões sobre novos procedimentos, outras intervenções  e eis que surge o assunto radiocirurgia. Infeliz, ou felizmente, o convênio do plano de saúde não autorizou esse procedimento alegando coisas como "mas você nunca disse que tinha essa doença quando fez o plano, não podemos cobrir"  
Oi? Eu preciso saber das doenças que eu tenho ou vou ter ao longo dos anos pra poder ter plano de saúde? 
É, foi mais uma novela, tivemos (minha super mãe, logicamente) que ir atrás de advogados, ler direitos, fazer documentos e o escambal... e então  nesse ínterim o médico achou melhor mudar a opção e que eu devesse fazer uma nova intervenção cirúrgica (do mesmo naipe da que fiz ano passado em SP) e foi o que eu fiz. 
Passadas todas as problemáticas com o plano de saúde, finalmente autorizaram.

Primeiro tive que passar numa consulta com anestesista... na sala de espera o diálogo: 
moça aleatória: "oi, é pré-operatório também? o meu é pedra."
minha mãe: "a dela é o cérebro."
cri cri cri cri....
Segundos depois entra um médico falando com a recepcionista:
"ah, tô atrasado, que horas são minhas consultas? qual o consultório hoje?"
recepcionista: não, doutor, você não tem consulta hoje, ainda não liberei sua agenda, pode voltar pra casa"
Apavorei! O anestesista não sabia que dia era e nem onde ele tava! E agora? Quando chegou minha vez, perguntei para a doutora que me consultou se seria ela na minha cirurgia, ela disse que não, mas que o médico que apareceu ali também não consultava mais e que eu podia ficar tranquila. Ufa!

Fui internada no dia 31 de outubro (uuuuuuuuuuhhh!)
A cirurgia foi no dia 1 de novembro, uma terça-feira. Me deram um remedinho pra dormir, fui pra sala de cirurgia vendo flores, coisa mais linda, não lembro de nada. 
Foi aquela coisa, retirada transesfenoidal (= pelo nariz) do adenoma (= tumor) hipofisário (= no cérebro) . Depois fui para a UTI, meio grogue logicamente, meus pais me visitaram por alguns segundos e  voltaram mais tarde. 
Passei a noite na UTI, sem comparação com SP,  o simples fato de saber que eu não estava longe de casa me confortava infinitamente. Mas isso não foi o suficiente. 
O ar condicionado tinha que estar altíssimo e eu, que estava com dois tubos no nariz fazendo pressão até o cérebro, tinha que sentir vontade de espirrar e.... tchanam! Espirrei! 
Imaginem duas rolhas impedindo uma cachoeira de sair do seu cérebro e fazendo ele flutuar e bater nas paredes de seu crânio! Gritei, gritei, gritei... as enfermeiras saíram correndo fecharam as portas do quarto da UTI, que eu estava, e injetaram uma senhora seringa de morfina diretamente na minha veia, fiquei em estado de êxtase, parei completamente olhando pro nada, foi um "barato" só. 
Depois disso aparentemente tudo ok, saí da UTI e  fui para o quarto. O cirurgião passou lá para tirar os tubos e foi aquela euforia... sentei na poltrona e ele disse "preparada?" e eu "vamos lá!" (bem macha!) 
Da maneira que estava inchado meu nariz,  eu imaginava que o tubo ia só até a metade do nariz, mas quando ele começou a puxar (sem anestesia e sem piedade) o negócio não parava mais de sair! Eu, de olho fechado, meus pais e meus irmãos  de plateia olhando aterrorizados aquele cano gigante saindo... tremi. E ainda tinha a outra narina. Mas lá fomos nós e aquele objeto saiu. O médico foi embora, voltei pra cama, familiares foram embora, fica apenas minha mãe de acompanhante durante a noite.... eis que meu nariz começa a escorrer feito torneira e a dor na minha cabeça fica insuportável e sinto como se meu cérebro dançasse dentro da minha cabeça novamente! Dor insuportável, enfermeiras ligam pros médicos, de uma em uma hora me aplicando morfina e o cirurgião informa: amanhã você vai novamente para a cirurgia. 
Eu já sabia  dos riscos da cirurgia (já tinham me falado ano passado), o nome do que ocorreu foi "fístula".  A cola (um pedaço de gordura da minha barriga misturada com uma cola especial pro meu cérebro) da abertura que fizeram no cérebro, em consequência do meu espirro, caiu... e, por isso, o liquor do cérebro estava escorrendo e a pressão disparou e meu cérebro ficou flutuando. Essa fístula é extremamente perigosa porque é uma oportunidade pra tudo que é tipo de doença perigosa (meningite e afins), então, a urgência pra fechar era grande. 
Fui novamente para cirurgia para fechar a fístula. Na manhã seguinte, dessa vez bem acordadinha e sem ver flores, aliás, no caminho para o centro cirúrgico, uma maca com um corpo recém passado dessa pra melhor passou pela minha  frente... 
Deixando a parte mórbida de lado, a nova cirurgia foi toda ok, fui entubada novamente, anestesia geral e tudo o mais... mas dessa vez fiquei com uma sonda em apenas uma narina, no final da sonda (dentro da minha cabeça, na abertura onde estava a cola) tinha um balão para comprimir a cola e não deixar abrir novamente.
 Voltei para o quarto, sem ir para a UTI.  A recuperação foi completamente diferente da vez de SP, lá eu parecia que nem tinha feito cirurgia. Aqui, eu realmente parecia (tô parecendo, né) uma pessoa doente. Recebi massagem nos pés do papai, cuidados 24h da mamãe, visita de irmão mais novo pra ver procedimentos de terror e até irmão do meio foi dormir no hospital comigo.
Os médicos me visitaram todos os dias no quarto, e pareceram dessa vez bastante otimistas. Disseram que conseguiram visualizar o tumor, conseguiram retirar e agora precisamos ver as reações clínicas e rezar para que tudo ocorra como esperado. 
Por mais que eu queira que seja como um episódio do House e acorde no outro dia linda e maravilhosa e curada, os resultados são lentos. 
Fiquei 4 dias com a sonda no nariz e o otorrino (colírio para meus olhos, diga-se de passagem) tirou o balãozinho de mim disse que iria falar com a minha endocrinologista (mais um anjo na minha vida que passou noites sem dormir preocupada comigo!) e eu estava liberada! Agora só estou com o nariz assado de tanto assuar, mas faz parte...
Depois de descrever todas essas "coisas maravilhosas"... eis que faço minha reflexão. Faltei algumas aulas de metodologia de pesquisa, então não vou aplicar teoria nenhuma às minhas observações e vou apenas "falar ao vento"...


Sempre que acontece alguma coisa na nossa vida a gente pensa "o que eu fiz pra merecer isso?" 
Eu pensei nisso novamente essa semana... 
Eu não faço a minima ideia do que eu fiz pra merecer tudo isso...
... tanto cuidado, tantas visitas, tantas mensagens positivas, tanta coisa boa num momento aleatório na vida das outras pessoas. 
O mundo não para quando nós passamos por problemas, mas perceber que as pessoas se importam e significam muito pra gente é uma coisa sem explicações. 
Assim como alguns se perguntam porque acontecem desgraças eu me pergunto "por que acontecem tantas coisas lindas na nossa vida?"
Recebi visitas de amigos que não via há anos, recebi visitas (mais de uma vez) de amigos que vejo sempre, recebi mensagens, recebi energias boas... 

Acho que o grande mistério da humanidade é porque nós passamos a vida buscando explicações. Só acho que o que vale a pena é buscar explicações pras coisas boas que acontecem e perceber que são beeeeeeeeeeeem grandes.
Aquela história do pontinho colorido que se sobressai no meio de um pano branco é bem verdade. O que demora pra gente perceber é que o pontinho colorido é que dá a dimensão pras coisas em volta e nós é que temos que dar o valor certo a elas.
Ok, já comecei a filosofar e falar muito abstratamente, então chega. 
Enfim... em breve (ou não) escreverei mais de outros momentos de "barato", porque agora já tô precisando sair da frente do computador antes que fique uma poça de ranho no meu teclado.


p.s. percebe-se que não fiz nenhuma revisão no texto, né? mas, por favor, deem-me um descontinho... (vou ficar usando essa desculpa um tempão! hahaha)

oração da graduação


Eis que demorei alguns meses para reescrever aqui. 
Na verdade  tenho tantos rascunhos que mereciam ser postados, mas  não tenho coragem de publicá-los (porque são realmente RASCUNHOS) 
Acho apenas que esse post merece ser publicado, está longe de ser algo completo e explicativo e eu deveria escrever coisas maravilhosas sobre esse momento, mas como deixei criar mofo ficou um pouquinho difícil de organizar.. então acho que vou apenas ao ponto que interessa: o discurso.
Sim, o discurso de formatura
Agora sou Licenciada em Letras Língua - Portuguesa e Literaturas Vernáculas, pela Universidade Federal de Santa Catarina, coisa chique! 
Lógico que eu não parei por aí e já passei no mestrado em Educação e agora sou "mestranda", mas aí já foge do foco do post...
Continuando... eu fui oradora da turma, junto com um colega. Estávamos numa super correria para finalizar trabalhos, fazendo provas e tudo o mais e ainda a "briga pelo discurso". Precisávamos de um texto pronto num prazo ínfimo daqueles que todos os universitários conhecem... e como eu sou eu, acabei puxando a responsabilidade pra mim e fiz o texto todo (claro que mandei pro meu colega pra ele dar suas sugestões, mas a sugestão dele foi: É ISSO AÍ!)
Então como o tempo urgia e nós precisávamos nos posicionar, deu no que deu...
Eu não quis escrever palavras muito emocionantes porque se eu começasse a ler e gaguejasse e borrasse minha maquiagem eu ia achar um desastre, então as palavras vieram pra representar o que nós (formandos - mais a nossa "patotinha" que entendeu, mas ok) queríamos dizer, sem muita choradeira... 
(mesmo porque choradeira a nossa professora paraninfa linda e maravilhosa já conseguiu fazer sem muitos esforços no discurso dela direcionado a nós, ainda citando nomes!)
Claro que eu tinha que colocar um "toque de Rafaella", ou melhor, de "Alice", mas tudo se encaixou.  Enfim.... lá vai:


Discurso de Formatura

ELE: Boa noite, primeiramente gostaríamos de desejar glória a todos os formandos...

EU: Glória? Mas o que você quer dizer com glória?

ELE: Eu quero dizer que esse é um dia especial para todos nós, porque finalmente acabamos a graduação.

EU: Mas glória não significa isso...

ELE: Como diria Humpty Dumpty, uma palavra significa exatamente o que eu quero que ela signifique.

EU: Como diria Alice, a questão é saber se você pode fazer uma palavra significar para você coisas diferentes do que significam para outras pessoas...

ELE: Continuando com Humpty Dumpty, a questão é... saber quem é que manda...

EU: Bom... É inevitável pensar em inúmeras citações para descrever o processo pedagógico (ou talvez não tão pedagógico assim) do curso de graduação.
Inicialmente nos fazem acreditar que nossa palavra não vale nada sem que esteja baseada em alguma teoria que a sustente, mas também há quem diga que isso é só provocação.
O ambiente acadêmico é um local onde se aprende a citar, a reconhecer os nossos discursos nos discursos do outro. É nesse reconhecimento de discursos que vamos nos constituindo, encontrando concepções que vão nos orientar (ou desorientar) em nossa vida acadêmica.

ELE: Agradecemos a todos que fizeram parte de todo esse processo (muitas vezes no estilo kafkiano!), aos que nos influenciaram em nossa busca pelo conhecimento, aos que nos apoiaram em todos os momentos, aos que apenas diziam que nos apoiavam e aos que não nos apoiaram em momento algum, desde os que nos disseram “você tem certeza que quer continuar?” até aos que nos disseram “vamos lá, precisamos revolucionar!” .

EU: Não foram poucas as lutas contra o tempo e os momentos em que gostaríamos de seguir o coelho branco e ir para o país das maravilhas... Apesar de tirarem nosso direito da “hora do chá” e as lanchonetes virarem salas de aula, ninguém cortou nossas cabeças... 
[Sim, isso foi uma sutil alfinetada, e nessa parte eu tava tão nervosa que errei a concordância e li "ninguém CORTARAM nossas cabeças". Vi jeito de pessoas gritando que iam cortar minha cabeça porque eu, uma FORMANDA DE PORTUGUÊS, errou a concordância! hahahaha]
Estamos aqui porque soubemos aproveitar as influências positivas e as negativas serviram de desafio para que fossemos muito melhor.

ELE: Hoje receberemos títulos diferenciados, de Bacharel e/ou Licenciatura, mas na essência isso não nos diferencia no exercício de nossas futuras profissões.
Afinal, trabalharemos com a palavra, somos profissionais da Linguagem. Quem trabalha com a Linguagem sempre estará compromissado com a interação entre as pessoas e o conhecimento.
Passamos por tanto e quando chegamos ao final da graduação nos vem à mente a pergunta da lagarta: “Quem és tu?” e não sabemos como responder...
Somos todos pesquisadores E professores, pois estamos sempre em busca de novos saberes e seja ministrando aulas, seja escrevendo artigos, seja fazendo traduções, produzimos conhecimento!

EU: Somos fruto das interações, feitos de infinitos “eu(s)”, somos um tecido de citações.
Entramos na Universidade sem saber quem exatamente éramos, terminamos a graduação e... continuamos sem saber! Mas... Como Alice respondeu para a lagarta: “eu sei quem eu ERA hoje pela manhã, mas já mudei muitas vezes desde então...” 
é esse, portanto, nosso objetivo: continuar mudando muitas vezes.
A graduação acabou, mas ainda temos muito pela frente...

Feliz desaniversário a todos nós!!


E essa foi minha oração final na graduação.