domingo, 6 de abril de 2014

O dia em que fui assaltada e ganhei uma flor.

Sim. Fui assaltada, à mão armada. 
Apesar da pessoa ter me levado celular e dinheiro, não me levou nada, absolutamente nada além disso, aliás, até me deu uma coisa... Deu uma reflexão. Vou parar de ser obscura e vou explicar...

Eram 23 horas de uma sexta-feira, eu estava no ponto de ônibus esperando para, tradicionalmente, me encontrar com amigos e relaxar no fim da minha semana atribulada. A rua estava movimentada, carros e pessoas apressados, pois acabava de começar a chover. Em algum momento da minha espera, vem em minha direção um homem de bicicleta. Não me preocupei, aliás, nem pensei em nada, até que ele sobe de bicicleta na calçada, pensei, então: serei assaltada. Tinha absoluta certeza disso, não me pergunte como. Apesar disso, permaneci parada, sem reagir, sem pensar, sem sentir medo. Sim, nada de medo, permaneci calma, consciente da situação, mas surpreendentemente calma. O homem, de boné e moletom - não estava bem vestido, mas também não parecia um morador de rua -, tirou de uma pochete, um revólver e soltou os dizeres: "me dá o dinheiro da tua carteira e o teu celular, e não grita senão estouro tua cabeça". Tranquilamente, eu abri minha bolsa, tirei o celular, abri minha carteira, tirei o dinheiro de dentro dela, fechei a carteira. Entreguei celular e dinheiro, continuei com minha carteira, bolsa, e tudo que tinha. Inclusive com minha tranquilidade. Aliás, tranquilidade que até agora não sei se era minha mesmo.
Fiquei alguns segundos sentada ainda, sem saber o que fazer. Levantei, e voltei para meu prédio, parei na portaria e disse ao porteiro que tinha sido assaltada, ele, muito solícito, perguntou se eu estava bem e me deu um copo d'água. Subi, meus pais não estavam em casa, comuniquei meus amigos, que me levaram para fazer um B.O. 
Depois disso, saímos da delegacia e fomos fazer um lanche. Sim. Eu continuava tranquila, não queria voltar pra casa e perder minha noite. Já no lugar, um (suposto) morador de rua aparece perto da gente, com uma caixa e uma flor e diz: "Boa noite... " e eu, mais do que rapidamente, respondo sem dar tempo de ele completar a frase: "não queremos nada, obrigada." e ele: "Vim te dar essa flor (uma rosa), não precisa pagar nada...". Naquele momento, eu paralisei, pensando no que acabara de me acontecer. Duas situações opostas, na mesma noite, que me disseram: você está bem, não importa o que tenha acontecido, você só ganhou, basta identificar o que, e não olhar para o pontinho colorido no papel branco.
Imagino que, os que lerem isso, pensem "Mas que síndrome de Polyanna! A Rafa ficou maluca!" Talvez eu até tenha ficado, mas não foi só agora. 
Essas situações só me fizeram refletir sobre o status quo da sociedade, refletir que não posso generalizar as pessoas que, supostamente, estão nas mesmas condições. Que eu, por mais que tenha "perdido" celular e dinheiro, estou bem, ótima, não perdi nada de significativo. Simbolicamente, apenas ganhei, uma flor, como um gesto de quem não me pedia nada em troca, uma bondade pra quem precisava dela. E eu não julguei depois disso, apesar do preconceito inicial, eu apenas aceitei a bondade. Porque a gente precisa, todo mundo precisa. Até mesmo o homem que me assaltou precisa. E ele, ainda mais do que eu.