sábado, 19 de março de 2011
e agora?
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
filosofia do improviso - ou, comentários (im)pertinentes
Confesso que estou com uma preguicinha aguda, parece que quanto mais tempo livre temos, mais preguiça dá. Não que eu tenha tanto tempo livre assim, mas já tive meus dias mais atolados...
A questão é: me forcei a escrever novamente para não perder a força do hábito.
Nesses últimos dias eu estava mais para "revisora" do que "escritora", e não é fácil não, quem é que disse que professor vai para sala de aula por que não gosta de revisão? Professor é revisor! (e também decifrador, porque tem cada hieróglifo, inacreditável!)
Foi uma tarefa árdua e satisfatória. Foi maravilhoso, na verdade, acho que devo ter uma pontinha de masoquista... Mentira. Não sofri com a tarefa de revisão, sofri com qualquer outra coisa que não é explicável em palavras educadas.
Bom (esse "bom" me lembra o início dos textos de um aluno #nostalgia), uma coisa que trabalhamos (é, "trabalhamos", porque meu estágio não fiz sozinha, foi com uma dupla de três, mas enfim, foi em DUPLA.) com os alunos foram "as dificuldades do começo", do começo de escrever, escrever sobre memórias... discutimos horrores, e quando começaram a escrever, adivinhem o que eles mais falavam "não sei começar!" É, a orientação aconteceu continuamente, e depois eles conseguiram começar (e continuar e acabar e ficou lindo!)
O que esses relatos tem a ver com o título? Então... por aqui, por mais que não pareça, tudo tem embasamento!
Conversando com uma (am)Ada amiga, cheguei a conclusão que improvisos são muito bem fundamentados. No meio do nervosismo de ministração de aulas também participei da ministração de um minicurso de Direito e Literatura, e pra que melhor do que usar o mesmo texto que foi usado na oitava série, mas com estudantes de Direito? Sim, texto sobre as memórias da Emília.
Minutos antes de iniciarmos o minicurso, conversavamos sobre a possibilidade de surgir perguntas absurdas e/ou incabíveis (ou que não soubessemos a resposta! hahaha), cada um reagiu de um jeito e no fim combinamos uma espécie de "saída de fininho", caso ficassemos em uma situação não muito agradável o jargão seria: "convidamos para participar das reuniões e discutirmos melhor essas questões, pois o minicurso tem outro foco".
No meio das apresentações das minhas colegas de minicurso, eis que surge uma pergunta, pronto, comecei a gelar (e acredito que as outras colegas também), não lembro qual era o teor da pergunta, a única coisa que eu lembro é que desatei a falar e minhas colegas acompanharam o raciocínio, numa espécie de improviso ensaiado... e desenvolvemos maravilhosamente a discussão! Apesar do pouco público e de nossa preparação ter sido às cegas, conseguimos dar conta...
O que mais foi maravilhoso - para mim, é claro - foi justamente a situação em que "tudo" se encaixa... um ser com cara de pré-adolescente, mas que pelo que parecia estava na graduação de direito, prestava atenção às nossas exposições/discussões sobre a Linguagem, e sobre discursos que teriam a pretensão de serem neutros e blablabla e, então solta um comentário "ah, mas meus amigos que fazem Letras dizem que os professores falam que uma poesia, por exemplo, TEM que ter aquela interpretação, senão tá errado"
Lógico que esse ser não sabia com quem estava falando e como pisou no meu calo eu não fiquei quieta... "Olha, eu faço Letras e não é bem assim" e aí a discussão desenrolou e foi muito produtiva!
Todas as minhas queridas colegas citaram (devidamente) Roland Barthes e por dentro eu chorava de felicidade! E Roland Barthes ao mesmo tempo em que era citado, fundamentava minha análise sobre o "improviso"...
A questão é: soubemos "improvisar" porque estavamos bem preparadas, não foi um comentário ao acaso, não eram simples enrolações... e o comentário (im)pertinente do serzinho foi o que suscitou a discussão que fez o minicurso render... Essas coisas (im)pertinentes é que dão mote às melhores conversas, pois ao invés de simplesmente ignorar um comentário, tranforma o comentário em algo produtivo!
No estágio aconteceu algo parecido... uma aula específica foi salva por causa de um comentário de uma aluna "não tô entendendo o que isso tem a ver com Português", pronto! Foi a minha deixa... ao invés de me apavorar terrivelmente, desenvolvi essa questão com eles...Barthes também fala de repulsa (da leitura) e desejo (da escritura)... a Repulsa em relação à leitura acontece quando alguma coisa é imposta (no caso da discussão do minicurso, seria a tal interpretação que o ser disse que os professores de Letras impunham aos alunos, o que não procede, tanto é que estou aqui expondo meu ponto de vista sem impor nada a ninguém, mas sempre lembrando: nada é neutro, haha) e aí o leitor não vê possibilidades de estabelecer relações com determinado texto, e acaba fazendo daquela leitura algo insignificante (ou, pior, acaba detestando um texto só por causa da maneira como ele foi tratado)
No caso da aula, talvez a forma como as informações estavam sendo tratadas (não, não foi por mim - posso parecer tendenciosa ou o que for, mas é fato) naquela hora estavam parecendo imposições e isso assusta, obviamente.
Não é por nada, mas, por exemplo, a maneira como tratei os textos no estágio foi tão linda, que até eu gostei mais deles! haha
Com certeza, depois de algumas ressalvas, suscitamos o desejo da escritura nos alunos... Esse desejo é a vontade de falar alguma coisa sobre o que se leu, é algum comentário específico que foi ponto de partida para discussões e para se estabelecer relações com outras coisas...
Minhas divagações podem parecer bastante abstratas, mas as minhas aulas foram bastante ilustrativas... O segredo: (que nem é segredo, é só uma habilidade que as pessoas deveriam ter) estabelecer relações.
Preciso até fazer uma confissão, acho que fui bastante "didática"! Não que didatismo seja uma coisa ruim, mas apenas gostaria de retratar alguns comentários antigos sobre "Didática", na realidade, acho que tive traumas com essa disciplina na universidade, e tenho minhas rixas com "pedagogia", talvez eu apenas não tive uma experiência muito boa, não é preconceito, é conceito formado, infelizmente.Voltando ao tópico, nem sei mais qual era o tópico exatamente, mas tudo bem, memórias são assim, vêm fora de ordem e não são muito claras... Ah! repulsa, desejo, relações... Vou justificar minha retratação sobre a crítica à didática...
Para "ilustrar" um texto em sala, fiz uma dinâmica, é, pasmem! Eu tive ideia de envolver os alunos em uma dinâmica de grupo! Euzinha... e deu certo! Ah, e pior (ou, melhor, na verdade...) não foi apenas uma aula, a maioria das aulas foram interativas!
Eu, que sempre tive pé atrás, quando estava na escola, com essas atividades que os professores faziam os alunos participarem em sala... Acho que eu tinha razão de não gostar, porque as atividades pareciam sem sentido e ninguém me explicava nada...
Nossos alunos tiveram explicações dos objetivos das aulas! E... tchanan! Como mágica, todos gostaram! Todos participaram!
Não falo isso sem embasamento, eles avaliaram! Ouvimos críticas e elogios deles... e nunca tive melhor avaliação na minha vida! Como diria Barthes (novamente), nossa orientação para leitura não foi imposta, fez eles participarem, por isso ao invés de repulsa, eles desejaram relacionar a leitura com críticas maravilhosas, e ao longo do estágio escreveram textos dignos de serem publicados!
Ainda vou publicar em algum lugar, acho que vou abrir uma editora só pra mostrar como os alunos são geniais! Isso que foi só a minha primeira experiência como professora, só tive 25 alunos!
Claro que as aulas não acabaram simplesmente quando acabaram (?!)
É, eu tive a brilhante ideia de fazer uma colcha de retalhos com as memórias deles... Pois, falamos sobre a etimologia da palavra "texto", que vem do verbo latino "tecere", e então nós íamos "tecer os textos" deles, cada aluno = um retalho, todos os retalhos juntos = colcha = texto. Foi lindo, maravilhoso, todos trabalharam em seus retalhos, mas... e depois quem costurou todos os retalhos? eu e minha dupla, LÓGICO! Quem tinha inventado isso mesmo? me diz quem! Porque eu ia matar!
Literalmente, dei meu sangue para costurar essa colcha! Sim, me cortei... e por pouco não manchei um retalho com um retalho do meu dedo! Mas como disse uma aluna "até as rosas tem espinhos, ou seja, tudo na vida tem as rosas e os espinhos."
Não seria tão perfeito se não tivesse imperfeições!
Os alunos escreveram suas avaliações, alguns colocaram nome, outros não (mas, segredinho... nós conhecemos as letras e sabemos quem escreveu o que!)
O que constatei... Nós sabemos os nomes deles, mas eles confudem nossos nomes, recebi uma crítica maravilhosa, mas não em meu nome.
Na verdade fiquei até me perguntando se era pra mim mesmo, senti que eu estava convencida demais, mas todos os indícios apontam para uma simples troca de nomes, condenem-me, fiquei martelando isso o dia inteiro e resolvi me conformar com a troca de nomes...
Como diz a Emília (que eu já citei no post anterior), o escrevedor de memórias coloca as memórias de jeito que o leitor fique fazendo uma alta ideia dele, então eu posso dizer aqui que foi tudo lindo, porque da forma como eu lembro e coloco, eu faço uma alta ideia das minhas memórias, afinal, elas são minhas... e segundo algumas alunas as aulas foram muito "glamurosas", porque eu sou muito "IXperta e fashion" e tudo porque eu sigo a minha filosofia de vida, a filosofia do improviso...
sábado, 18 de setembro de 2010
Feliz desaniversário!
Em relação ao cushing, nem sei mais o que as pessoas sabem. Acho que precisam saber apenas que eu optei por abandonar a doença, não, não achei uma cura milagrosa e muito menos abandonei o tratamento, pelo contrário... Viajei novamente para São Paulo - pela última vez com esse propósito - fui a nova consulta e me deram o resultado dos exames da cirurgia: foram retirados dois fragmentos tumorais (!?), porém, não foi o suficiente, alguma coisa restou lá (lá = minha hipófise) e continuei produzindo o inconveniente cortisol. Os próximos encaminhamentos se restringiram a poucas opções... Decidi continuar o tratamento com medicamentos na minha cidadezinha maravilhosa - que não é o Rio de Janeiro e muito menos São Paulo! - Essa MINHA opção está resultando no controle do nível de cortisol, vejam só! Não me importo de ter que tomar o cetoconazol (que é o remédio que controla o cortisol) até não sei quando, um comprimido é muito menos estressante do que viagens!
Defini o cetoconazol como meu antidepressivo. Não preciso de uma data específica ou de algum acontecimento marcante pra lembrar que estou bem, os dias estão mais bonitos e por incrível que pareça, estou mais tranquila, MESMO. É mais ou menos como quando Alice conversa com Humpty Dumpt e ele diz que gosta de ganhar presentes de desaniversário, porque todos os dias do ano - tirando um - são desaniversários, então seria muito melhor se comemorassemos todos os dias...
Pode ser que eu adore viver num conto-de-fadas, mas é porque não consigo conter o meu encantamento quando faço relações "teoria-prática".
Junto com minhas decisões e resultados positivos de exames de cortisol, vieram as aulas. Sim, estou no estágio de docência! Darei aula para uma turma de oitava série do ensino fundamental. A escola é boa, os alunos são bons, a professora da turma é boa, é uma situação ideal, no sentido estrito do termo! E o tema que nos ficou designado para trabalhar com eles, também não poderia ser mais perfeito: "memória"! Posso relacionar experiências com a teoria, colocar em prática o que eu idealizo, utilizar exemplos... memórias!
O início do estágio começou com uma oportunidade de irmos (eu e minha dupla de três) para Minas Gerais visitar as cidades históricas junto com os alunos do colégio. Fomos pedir auxílio financeiro e etc, mas... como num Processo Kafkiano, por impedimentos burocráticos não fomos viajar - a Universidade tinha o dinheiro mas não tinha como repassar a verba (????) - é, não conseguimos entrar n"O Castelo". Acompanhamos as atividades dos alunos que não foram viajar e tivemos mais tempo para nos organizar por aqui... Como eu tive um estágio de ouvinte enquanto estava no hospital, aprendi a lidar com a necessidade dos outros de contar histórias, ou seja, agreguei à minha experiência vivida as experiências narradas por outras pessoas - desde que entrei na faculdade Walter Benjamin está sempre presente me fazendo relacionar teoria-prática! - por isso, não foi tão frustrante... A ironia é que eu deveria fazer relatórios diários sobre as observações das atividades da escola, mas eu, como boa procrastinadora que sou, acabei deixando e deixando e deixando... e quando percebi, os relatórios pareciam Gremlins quando se deixa pingar uma gota de água! Multiplicaram-se! Apesar dos pesares e reclamações típicas (porque mesmo ficando encantada com tudo, como eu já disse, não aconteceu um milagre) parei para escrever meus relatórios e depois juntei com os das minhas colegas e fui ler (todos), conclusão? fiquei mais encantada! É absolutamente incrível como três pessoas escrevem coisas muito diferente observando a mesma situação! E aí vem teoria de novo: como a narração das pessoas constroem a história, como as coisas vão se costurando e se relacionando se forem bem analisadas, bem aproveitadas...
Os alunos da oitava série tinham como tema norteador da viagem para MG: Inconfidência Mineira (óh!!!) e o Arcadismo... partindo, então, dos princípios Clássicos "carpe diem" relacionando memórias, experiências vividas, narradas, concluí que não preciso ser fiel aos fatos (e somente aos fatos!), pois como diria a Emília, de Monteiro Lobato: "quem escreve memórias arruma as coisas de jeito que o leitor fique fazendo uma alta ideia do escrevedor. Senão o leitor fica vendo que era um homem igual aos outros." Por isso mudei... de "cortISOLADA" para "(in)confidente".
domingo, 8 de agosto de 2010
Nada pode ser tão (ruim ou) perfeito; tudo pode melhorar!
sábado, 31 de julho de 2010
domingo, 4 de julho de 2010
quase-título
Depois da cirurgia, fiquei mais ou menos umas duas semanas sem sentir cheiro, nem gosto... A sensação é muito estranha, você sente fome, sente vontade de comer, mas come como se fosse uma obrigação e sem sentir prazer nenhum! É frustrante! Confesso que não escrevi antes sobre isso, porque estava morrendo de medo de não sentir mais cheiro/gosto nunca mais na vida! Aí que se encaixa a frase citada anteriormente... Quando eu dizia que a minha recuperação estava boa, vários “alguéns” repetiam "mas pelo menos depois disso se sabe o quanto era bom e não se dava valor" - acho que ninguém pensa muito quando fala isso.. Parece que seria como se eu antes não desse valor pra isso, mas eu, mais do que ninguém, sei muito bem que eu SEMPRE valorizei um cheirinho de perfume, ou de café recém passado de manhã cedo, do gosto da pizza da minha tia, do bolo de maçã feito pela minha vó... é quase como o episódio de Proust com o cheiro de Madelaine – um bolinho que ele sentiu o aroma e fez lembrar da infância - , são coisas que ativam a memória e mandam alguma informação pro cérebro dizendo “isso é maravilhoso, aproveite”. Antes da cirurgia meu cérebro estava perfeito e recebia essas informações, não vou receber melhor essas informações só porque fiquei um tempo sem elas. Essa mania de achar que precisamos sempre passar por um problema pra depois dar valor a alguma coisa específica, isso está errado! Cheguei a cogitar a possibilidade de tanto ouvir isso, pensei “mas eu achava que dava valor pra sentir gosto; adoro cheiro, gosto, comida, perfume... o que eu precisava fazer pra provar isso? tenho que fazer outdoors descrevendo todo o prazer que sinto quando tomo uma xícara de café?” Não, não é assim. Fiquem tranqüilas, pessoas. As coisas não acontecem simplesmente para nos castigar, ou para “nos dar uma lição”, as coisas acontecem, porque acontecem, oras. Claro que não tem problema sair contando pra todo mundo o quanto você gostou de alguma coisa, as pessoas gostam de sugestões e dicas de coisas boas, mas não precisamos ficar esperando acontecer um problema pra só aí começar a falar do que se gosta.
Por exemplo, podem me chamar de maluca, mas eu gosto do meu nariz, acho lindo. É, isso mesmo.
No meio dessas intempéries, cheguei a sonhar com isso no hospital, um pesadelo na verdade, que tinha acordado como o personagem do Gogol, sem nariz! Mas aí acordei e me olhei no espelho... Depois de ter ficado com dois cones dentro dele, inchado, pingando e descascando, parecendo o Rudolf (aquela rena do papai Noel que tem uma lâmpada vermelha como fucinho) ele voltou ao normal, fazendo parte novamente do meu rosto, como deveria ser (mesmo eu parecendo o piu-piu, com as bochechas crescendo desenfreadamente e a boca sumindo no meio da face), meu nariz voltou a ser lindo, até achei que ele ficaria bem sozinho (fora do meu rosto) porque parece que não se encaixa um nariz “normal” -que eu ainda reconheço como “o meu nariz” - no meio de um rosto de uma estranha, mas percebi que cada um tem o nariz que combina consigo, sempre há quem possivelmente não goste, mas aí tem opções - na maioria das vezes corre-se o risco de ficar parecendo o Michael Jackson (R.I.P.), eu não recomendaria, acho que seria mais legal se fizessem como o dentista do Veríssimo, que resolveu usar um nariz de mentirinha e provocou maior polêmica, se a intenção é chocar, vamos fazer direito!
Bom, mas voltando à explicação do ex-título... Não poderia utilizá-lo pelo simples fato de que já voltei a sentir cheiros, gostos e o principal... não estou livre do cushing. Deve ser porque sou uma pessoa muito cativante. À primeira vista, na maioria das vezes, começam me achando muito quieta, metida, tende-se a me detestar, mas aí me conhecem, continuam me achando metida, mas se passaram do primeiro estágio e não me detestaram aí é porque são guerreiros mesmo e não vão conseguir se desapegar de mim tão cedo. O cushing provavelmente foi parecido, no começo eu era metida e estava quieta (nem sabia que tinha), agora não estou mais quieta (porque sei que tenho) e continuo metida, mas ele não me deixou depois da primeira cirurgia. A doença não conhece o ditado “quando um não quer, dois não brigam”. Na realidade acho que eu fui muito boazinha, aceitei cirurgia sem revoltas, estava indo tudo muito bem, eu estava agüentando esses processos “tranquilamente” (seja lá o que isso queira dizer) e isso foi um problema.
Depois de 10 dias de cirurgia, cheguei na consulta de retorno me recuperando maravilhosamente. - nem parecia que eu tinha passado por um procedimento que envolvesse meu cérebro, todos achando isso uma coisa muito boa, de certa forma até eu (mesmo que eu não estivesse notando NENHUMA diferença de antes da cirurgia e essa indiferença estivesse martelando na minha cabeça) – e vendo essa recuperação muito rápida, a médica da endocrinologia diz “isso não é bom, você está muito bem, era pra você estar muito mal!” e as marteladinhas na minha cabeça viraram um bate estaca daqueles de início de construção de um super Shopping Center.
A cirurgia não teve o efeito esperado. Eu tive certeza que não estava curada minutos antes de me encontrar com a médica. Dessa vez, fomos somente eu e meu pai para SP, chegamos +/- 6h40 no HC para conversar com a endócrino antes de ir na neuropsiquiatria – que eu tinha consulta as 7h30, pergunto para o recepcionista sobre a médica e ele responde que ela ainda não chegou, soltei um palavrão tão automaticamente - por ter ficado irritada que poderia chegar atrasada na consulta na neuro – que até meu pai ficou com pena do recepcionista que não tinha culpa de NADA, percebi que com certeza o nível do meu cortisol não poderia ter baixado pra eu ter ficado tão irritada com uma coisa tão pequena e ter forças para ter sido tão mal-educada.
Com a retirada do tumor, era pra eu ter tonturas, náuseas, anorexia e vários outros tipos de mal-estar, pois o nível do meu cortisol era pra ter baixado muito repentinamente e meu organismo teria que se readaptar, porém, o nível de cortisol não baixou e meu organismo continuou o “mesmo”. A cirurgia na realidade serviu para a raspagem da sinusite. O resultado da biópsia, do que eles supostamente achavam que pudesse ser o tumor, ainda não saiu, mas já era pra eu sentir a diferença (que infelizmente não sei qual é). Nunca quis tanto me sentir mal na vida. Dizem que mulher complica as coisas, só que a opção que me oferecem é de se sentir mal para estar bem e eu estou me sentindo bem, mas estou mal (????) e o pior (ou melhor, já nem sei mais) é que estou bem! Ok, é confuso, muito. Saí de lá sem saber quais os próximos passos, já que essa primeira cirurgia não foi eficaz. Já sabia que existia a possibilidade de isso acontecer, tem casos de pessoas que fizeram 3 cirurgias na hipófise, pois a retirada do tumor não foi completa, ou o tumor não foi encontrado. Tem outros casos que se retiram as adrenais (as glândulas produtoras do cortisol), porque a hipófise é a comandante, ela manda informação pras glândulas produzirem, se não se encontra a falha na gerência o que temos que fazer? Mandar embora os funcionários, porque se não tem pra quem mandar informação aí ela não pode fazer nada, certo? Mas eu ainda não sei o que será feito, não tive mais notícias. Ainda não decidiram o que me dizer e o que fazer... A coisa mais frustrante pra uma pessoa controladora é saber que você não controla coisa alguma - o pior, você não consegue nem controlar a si mesmo.
Por enquanto... continua ressoando na minha cabeça “você tem que ter paciência”, a frase mãe das frases mais chatas do (meu) universo.
sábado, 19 de junho de 2010
amigos da Lavínia
Da primeira vez que fiquei internada, os primeiros pensamentos que me vieram à cabeça eram “aimeudeus, vou sair daqui pra psiquiatria!” Adivinhem só onde estou nesse exato momento!? Pois é! Sim, na psiquiatria... Não é pior que a endocrinologia, tirando alguns detalhes da limpeza e das partes administrativas, o que em tese não era pra amedrontar, porque a princípio todos pensam que na psiquiatria só tem gente doida (pacientes), não, absolutamente. Acho que tirando eu, a maioria são pessoas lúcidas, mas estão aqui por problemas de comunicação, com seu próprio cérebro. São coisas complicadas, nosso organismo é muito complexo e eu acho isso alucinante! O problema daqui é que nem todos os quartos têm banheiro e os banheiros são mistos e a limpeza não é “aquelas coisas” e aí eu entendo porque várias pessoas vão tratar uma simples unha encravada e saem com uma infecção hospitalar... mas vou deixar os detalhes sórdidos para depois... Então, agora estou supostamente “descunshingada”, como diria uma amiga minha... Estou na reta final da novela, bem mais pra uma epopéia, na verdade.
Depois que voltei do cateterismo pra casa, esperei um mês e voltei para consulta, dessa vez meu irmão mais novo também foi, viagem dele de avião pela primeira vez, legal ver os olhinhos dele brilhando e não sentir apenas “estou indo para consulta médica”, parecia que o motivo da viagem não era eu, estava me sentindo secundária e não “a paciente”, nessas horas que percebemos os trocentos papéis em que atuamos... Por exemplo, eu fui tão insignificante nesse dia, que quando chegamos em SP, fui entrar no táxi e o motorista tocou o carro fechando a porta na minha cabeça e aí minha mãe gritou “pára, a minha filha não entrou ainda” olha, que agradável, essa foi a mensagem de “bem-vinda de volta”, percebi que o taxista ficou super sem graça, baixou minha pressão, mas tudo ficou bem. Como não precisei ficar internada, podíamos passear, porém, nada muito longe do hotel, porque eu tinha que fazer xixi no pote (pra variar!), ou seja, meu irmão conheceu o shopping. Mas era longe de casa então é tudo festa... até com o café da manhã se fazia piada... descemos de manhã cedo, cada um se serviu e quando ele foi tomar o suco que tinha pegado “ah, não vou tomar esse suco, porque (...)” e a mãe “que???” É, a besteira era tanta que a frase “não gosto dos gominhos da laranja” virou “não gosto dos amigos da Lavínia” mas enfim, no outro dia fui para a consulta saber do resultado do cateterismo, esperando respostas e etc... e... bom... o propósito do cateterismo era medir os níveis de hormônio de cada lado para saber onde a produção era maior e então localizar o tumor, chegando lá... “É, não deu muita diferença, então deve ser central” ÓÓÓÓÓH! O que isso quer dizer? Que o cateterismo só serviu pra confirmar novamente que eu tenho (ou tinha, seilá) cushing! mas não deu a localização exata, só com a cirurgia pra saber então... é! A notícia foi: seu nome está na lista de espera da cirurgia, pode ser que demore de dois a três meses, continue tomando cetoconazol, porque teu organismo está respondendo bem ao remédio que nós vamos te ligar pra avisar a data certa.
Voltei pra casa, tentei organizar a maioria dos meus trabalhos da faculdade, apresentação para a Semana de Letras, organização do Simpósio de Direito e Literatura, colocar leituras em dia, maior correria, semana apertada e eu torcendo para que me chamassem para cirurgia antes do próximo semestre, porque afinal, o próximo semestre é estágio e não poderei faltar... passaram-se duas semanas, terminou semana de Letras, terminou Simpósio, organizei metade dos trabalhos e... o telefone toca numa quinta-feira “Rafaella? Então, sua cirurgia está marcada para próxima quarta-feira, você tem que se internar no domingo” Perfeito! Super dentro dos meus planos. Semestre que vem meu estágio não estará comprometido! Correria pra comprar passagem, friozinho na barriga, dessa vez o pai veio junto também... Últimas palavras no aeroporto “quem/como será a Rafaella sem cushing?” Dessa vez, empresa aérea diferente das anteriores, não sei se era efeito da “anestesia” da notícia, mas pareceu um vôo mais tranqüilo... Chegamos, friozinho, tempo legal, fomos jantar num buffet de sopas... última vez com cushing, que eu sentia gosto...
Manhã seguinte: vou me internar. Chegando na psiquiatria, setor de neurocirurgias, encontramos o médico residente – enfatizando o sentido do termo “residente”, nunca vi igual, ele está a noite e o dia inteiros no hospital!! – Fui para um quarto com um caso de Parkinson, um de Alzheimer e um de cirurgia de reconstituição do maxilar, nos quartos próximos a maioria das pessoas com cortes e costuras na cabeça e afins... tremedeiras, perda de controle motor, e deficiências físicas decorrentes de choques traumáticos não são sinônimos de sintomas de pessoas loucas, muito pelo contrário, admito ter entrado aqui extremamente preconceituosa, e o mais incrível foi ver que essas pessoas, infelizmente, são extremamente lúcidas, porque ver as coisas tremendo, se ver no espelho e não se reconhecer e ter consciência de que aquilo você não pode controlar é uma sensação muito ruim. Mas foi muito legal ver pacientes que tinham Parkinson desde criança, e com 30 e tantos anos, depois da cirurgia saíram andando como se nada tivesse acontecido, um outro paciente que num dia teve a notícia que podia perder o olho por falta de lubrificaçao e que talvez não conseguisse andar por causa do tamanho do tumor na cabeça que prejudicou o labirinto, no outro dia chorando e indo embora caminhando equilibrado, por mais que seja um ambiente terrível e amedrontador, acho que esses detalhes é que prendem alguns médicos, como esse residente... Já percebi que os verdadeiros profissionais não consideram a profissão como apenas um detalhe na vida, mas sim como alguma coisa que faça grande parte de sua vida, apesar de algumas decepções, sei que existem alguns profissionais que se destacam, porque mostram que gostam do que fazem, tenho alguns professores maravilhosos, que me inspiram a continuar e ainda bem que pra cada área existe alguém assim...
Voltando à descrição do meu processo cushiniano...
Minha cirurgia foi antecipada para terça-feira, dia do jogo do Brasil na copa do mundo, ainda bem que o jogo era à tarde e a cirurgia de manhã, porque sabem como são brasileiros na copa do mundo, né... Assisti o jogo na UTI, ou melhor, ouvi o jogo, porque meus olhos estavam tão inchados e lacrimejando que eu não enxergava nada. Foi a pior noite da minha vida. Bom, a cirurgia foi transfenoidal, não tenho cicatriz nenhuma, é feita uma abertura dentro do meu nariz abrindo um caminho pra chegar até o cérebro e retirar o tumor, no meio desse caminho eles detectaram que eu estava com um quadro de sinusite muito forte, ou seja, meu rosto estava cheinho de pus – o que explicava as minhas crises terríveis de dor de cabeça, porque o meu tumor é micro e a principio não é motivo para dar dores de cabeça – aí tiveram que fazer uma raspagem antes da retirada do tumor. Saí bem da cirurgia, acho que o efeito da anestesia não foi tão alucinante, lembro de como eu saí do centro cirúrgico e tudo o mais... e infelizmente lembro da noite turbulenta da UTI, não preguei o olho nenhum segundo, estava com um cateter no pescoço, sonda (pra fazer xixi, porque eu não podia levantar e cumadre, nem pensar!), e dois cones dentro do nariz fazendo uma pressão significativa... foi traumatizante, eu tinha que respirar pela boca e a minha boca estava extremamente seca e se quebrando e meu rosto machucado dos curativos e esparadrapos aí quando lacrimejava escorria e ardia muito e a minha garganta também doía porque fui intubada na cirurgia... os enfermeiros sumíam e não tinha quem me desse água, eu não conseguia falar... 24h de sufoco, mas passou.
No outro dia vim pra outro quarto, com banheiro! A noite ainda foi ruim porque o nariz não para de escorrer, mas nada se compara a UTI, isso que a minha cirurgia nem foi tão invasiva assim... não desejo essas coisas pra ninguém, mas se é preciso, “é só ter paciência”, os dias vão passando e cada dia é melhor que o outro – voltei pra literatura de auto-ajuda – No primeiro dia ainda tive uma crisezinha, mas foi coisa rápida, a gente fica mole quando os pais estão perto, sabe como é, nessas horas quando a gente tá no papel de filho... às vezes a gente derrete um pouquinho demais quando sabe que tem alguém pra cuidar e ainda bem que dessa vez tinha dois alguém comigo, porque eles se cuidam mutuamente também...
Hoje é o quarto dia após a cirurgia, estou ótima, amanhã tenho alta. Nem parece que fiz nada, parece que tive um resfriado,não sinto gosto das coisas e estou que nem criança ranhenta que não limpa o nariz. Se a cirurgia for bem sucedida, o que me parece que foi, a problemática é a da cicatrização. Quando se abre o tal caminho no nariz, para fechar não é tão simples, eles colam com uma espécie de cola biológica, torcendo para que não se descole, para que eu não desenvolva uma fístula. Um sintoma de que teria ocorrido fístula, seria que eu ficaria com um líquido parecido com água escorrendo freqüentemente pelo nariz, que teria que ser drenado, para poder secar a cicatrização e não deixar o canal aberto pra infecções como meningite e doenças oportunistas do gênero... O cirurgião me disse que encontraram um (suposto) micro-adenoma e que foi retirado com sucesso e enviado para análise pra ter certeza do que era e etc, no mais, estou fazendo exames periódicos de sangue e estou tomando acetato de cortisona pra fazer meu organismo ir se acostumando aos poucos com a queda da produção do hormônio, cortisol. Ah! Outros efeitos colaterais possíveis (que me foram informados) seria uma tal de Diabetes Insipidus, que é uma retenção e perda grande de líquido, ou seja, sinto muita sede e faço muito xixi, por isso nesses primeiros dias tem que medir a quantidade de xixi e de liquidos que tomo, na primeira noite tive D.I., medicaram-me com uma injeção de DDAVP e ficou normalizado. Farei ainda mais exames pra saber os próximos passos do tratamento.
Ainda não estou num estágio muito poético da minha recuperação, talvez amanhã quando eu sair do hospital eu seja inspirada pelas musas... afinal, não sei ainda o que é (ter e) não ter cushing... mas uma coisa eu tenho certeza, sei que eu não sou eu, eu sou várias.